Pedro Ângelo, velho conhecido por seus “causos” e“estoritas”, contava que, nos bons tempos da seringa, morava no
“Alto Rio Curuçá”. Como a coisa ficou apertada por lá, resolveu “baixar o rio” para arriscar a vida em Benjamin junto com dona
Laura, sua esposa e a “reca de filhos”. Pegou “os quase nada” e largou rio abaixo rumo à terra prometida (B.C.). Na “alvarenga”,
“encangada” ao seu motor, trazia algumas “pelas” de borracha e uns bons “panos” de palha caranã para negociar e juntar alguns réis.
Viagem tranquila, tudo dentro dos conformes, já nas proximidades do rio Javari, Laura tratava peixe na popa do motor e
jogava o bucho n’água, quando de repente viu surgir um enorme rebojo bem perto da embarcação. Assustada, correu para avisar seu
marido que pegava leme. Pedro, mais que depressa, entregou o comando ao Gildardo, um dos seus filhos mais velhos, e foi ver o que
estava acontecendo. Assim que chegou na popa, foi logo vendo uma bruta cobra grande com a boca escancarada tentando abocanhar o
barco. Mais rápido do que um raio, entre gritos e choro da meninada,pegou o paneiro de farinha e jogou dentro da boca da bicha. Nisso, o enorme animal se acalmou e sumiu nas profundezas das águas barrentas do Javari. Depois de alguns minutos, lá se vem a cobra de novo. Pedro Ângelo, babando de raiva, vendo a fera “palmi-dentro”, joga desta vez um tamborete e o cacho de banana pra ela não “apurrinhar” mais. E lá se foi o rancho da família! Tudo parecia resolvido, mas a danada voltou. Como já não tinha mais o que jogar para saciar a fome do animal, a única solução, segundo Pedro, seria sacrificar um dos meninos – já que eram tantos – para resolver de vez a situação. Aos gritos, Laura rebateu:
– Meu filho, não!
Então Pedro argumenta:– Minha velha, ou a gente faz isso ou “nóis tamo é
afuzilado”! Sem saída, resolveram jogar o mais gordinho, João
Ângelo, que por sinal era o mais peralta.
Pedro muito triste, porém decidido, pega João, dá a bênção e rebola o moleque goela a dentro do mostro, que, de barriga cheia,
vai embora. Bastante tristes pelo acontecido, mesmo assim resolveram seguir viagem. Quatro pontas de praias abaixo, viram a
dita cuja, carcará, sanguinolenta esticada na Praia do Tucano. Pedro,mais do que depressa, encostou o bote, pegou sua espingarda calibre 16 e sapecou um tiro na cabeça da fera que estremecendo foi dando sinal de “morrência”. Puxou sua peixeira e abriu a barriga da bicha pra resgatar o corpo do filho, que, para sua surpresa, encontrava-se sentado tranquilamente no tamborete se “empanturrando” de banana com farinha.
Se você não acredita, pergunte ao Manoel Ângelo, um dos filhos de Pedro, que ele confirma.
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